MAIS UMA DE AMOR - Nicole Furtado


Acabo de chegar em casa e vou logo procurar o amor. Já faz um tempo em que essa é a minha rotina. O amor existe aqui dentro de mim e vai comigo pra todos os lugares, eu sei, mas ultimamente é como se ele estivesse dormindo o tempo todo e precisasse de algo pra estimulá-lo, cutucá-lo, dizer: ei, acorda, a vida não é a mesma se você não me ajuda a enxergá-la. Então, insistentemente, num exercício pra não te perder, não te deixar pra trás, eu começo a estimular meu amor. E a contar histórias com final feliz, e dizer calma, tudo bem, vai passar, a esperança ainda é sua amiga, não tenha medo. Mas no amor a gente não manda, todo mundo sabe. Amor é o bicho mais teimoso do mundo, só aparece quando quer e vai embora sem avisar. Por mais que todas as histórias, todas as esperanças, todas as palavras, por mais que todos os incentivos do mundo o digam pra ficar, o amor cisma em ir. E voltar. E ir de novo. E transformar a vida numa verdadeira montanha-russa. Hoje aqui, amanhã não se sabe.
Eu queria te ligar pra te contar essas coisas, pedir pra que mesmo que você não viesse agora, que você dissesse bem baixinho pro meu amor, em tom de segredo, o segredo mais secreto do mundo, que você vai voltar, que é pra ele ser forte, agüentar até o fim, que você volta. Mas não dá. Não dá pra pedir uma coisa dessa. Eu queria mesmo é que você percebesse. E que chegasse um e-mail seu, ou que você chegasse pessoalmente. E que dissesse pra mim, olho no olho, verdade com verdade, olha, eu sei que é difícil, pra mim também é, mas espera, o fim sempre vale a pena, não deixa isso se perder, não deixa o amor se esconder tanto assim. Eu ia te abraçar então, e pedir pra que você não desse motivos pro meu se esconder e fugir e deixar de acreditar nele mesmo. Porque que a gente deixe de acreditar no amor até vai, mas o amor perder as esperanças nele mesmo é caso grave. Caso grave que não pode ser o nosso.
Eu queria ter noticias do seu amor. Saber como ele está sobrevivendo a todo esse frio, se é que faz frio pra você. Saber com o que ele se distrai enquanto eu não chego pra completá-lo. Eu queria ver o mundo com seus olhos, pra saber se a minha falta surte o mesmo efeito no mundo que a sua falta causa em mim. Mas de tudo o que eu queria, eu só queria você. Em texto, poesia ou canção. Mas você quem? Será que você, o meu você, ainda existe aí? Faz tanto tempo que eu nem sei. Eu também mudei, você sabe. E mudo a cada dia que passa, acredito que você também. Tenho medo de que nos tornemos irreconhecíveis um pro outro, depois de tanto tempo é normal que isso aconteça? Me ensina então, me conta sobre o seu novo estar em si mesmo. Me conta sobre o que você aprendeu durante esse tempo. Deixa eu te mostrar o que eu aprendi, te falar o que ouvi e te escrever o que senti. Faça com que meu amor tenha motivos pra andar por aí dando a cara à tapa. Os outros não acreditam? E daí? Faça com que meu amor acredite e isso será o bastante pra mim. Mude o quanto for necessário, mas volte sempre pra me contar sobre o novo você, mantenha sempre o meu lugar aí dentro. Aloje outras pessoas, mude a cor da casa, reforme os cômodos, mas nunca, nunca me retire do lugar em que estou. Abra as janelas pro sol entrar, feche-as quando chover. Limpe a casa, faça a faxina regularmente, tire todas as pragas, mantenha a porta aberta pra que quando a hora chegar eu possa entrar e me abrigar permanentemente em ti. Num lugar limpo, sem impurezas e sem motivos pra temer.
Se cada coração é uma casa, você ocupa a sala principal. Os outros ficam com quartinhos de visitas, porque nunca duram mais que alguns dias. Se cada coração é uma casa e você ocupa a sala principal, é provável que o meu amor esteja escondido no armário ou embaixo do tapete. E se quer saber? Deixo ele lá. Só assim ele não se suja, não se corrompe com o mundo aqui fora.
Quer saber mais ainda? A porta tá aberta, a janela também, venha quando quiser, o amor tem medo, mas quer. E quem quer espera. Tô sentada na primeira fila pra te receber.

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