A ARTE DE AMAR...Véronique Vienne


O galante admirador que sempre leva flores para a namorada não é tão irresistível quanto o pretendente que joga o casaco, as luvas e o chapéu no sofá antes de abrir os braços e apertar a amada em um abraço apaixonado.

Quem está verdadeiramente oferecendo o coração não leva presentes. Não se pode abraçar – ou ser abraçado – segurando coisas. A linguagem corporal do amor é a da disponibilidade. Receba o verdadeiro romance de mãos vazias.

Quando duas pessoas se amam, elas agem como se estivessem em uma ilha deserta. As preocupações mundanas deixam de existir. É o momento de uma verdade de absoluta simplicidade e graça – isento de necessidades e desejos.

Perdido no olhar da outra pessoa, você está seguro. Descruze os braços. Pare de mexer no cabelo. Tire as mãos do bolso. Guarde o celular. Não agarre o smartphone ou a bolsa. Desabotoe o paletó. Tire os óculos. Baixe suas defesas. Abra caminho para o que está por vir.

Preocupar-se com troca de presentes estraga o momento. “O presente do amor não pode ser dado; ele espera ser aceito”, escreveu o filósofo bengalês Rabindranath Tagore. Presentes sempre levam consigo obrigações disfarçadas. Poupe seu amado do peso de suas expectativas. Em vez disso, fique de pé, braços ao longo do corpo, peito aberto, pronta a aceitar sem reserva e sem recurso o veredicto do coração do outro.

O que vale para o namoro vale também para a amizade. Excesso de solicitude pode atravancar um relacionamento entre amigos. A pessoa que viaja muito e sempre volta com um mundo de presentinhos e lebrancinhas provavelmente será menos bem-vinda em sua casa do que o solteirão sem um tostão que se convida para jantar e promete lavar os pratos depois.

E, mesmo não havendo prazer maior no mundo do que dar presentes para crianças, essa alegria deveria ser reservada a ocasiões especiais. A tia bem-intencionada que sempre aparece com brinquedos acaba se tornando inconveniente; já o vovô que nunca traz nada nas visitas, mas faz os netos rirem ao mexer as orelhas, acaba se tornando o adulto favorito deles.

Quando se ama, dar é um ato de rendição. Na prática, isso significa que você tem de ceder, repassar ou desistir. Ou seja, deve estar disposto a ir contra sua própria resistência. Um marido atento, por exemplo, sabe que, sempre que sua mulher lhe pede para levar o lixo para fora, seu primeiro impulso é dizer “Claro, querida”, e não fazer nada. Sendo assim, cada vez que ela lhe pede para fazer uma das triviais tarefas domésticas (passear com o cachorro, guardar os sapatos, tirar a louça da máquina), ele já sente a familiar resistência tomando conta. É sua chance de pular e fazer imediatamente. “Aquele que dá rapidamente dá em dobro”, disse Cervantes. O autor de Dom Quixote era um cavalheiro antigo, sem dúvida. Mas o que é o amor senão uma insensata e nada prática aventura?

Uma esposa romântica também abre mão de seu conforto, sobretudo quando isso lhe desagrada. Uma coisa que a irrita sobre seu companheiro é o modo como ele se sente perdido quando a pia entope ou o carro não pega. Que seja. Quando o desastre acontece, ela corre para seu lado com uma chave de fenda, uma lanterna, uma esponja – mesmo que o esmalte ainda não esteja totalmente seco.

Trate os aborrecimentos do dia-a-dia como se fossem flechas do cupido. Não ataque ao sentir a ferroada da irritação. Em vez disso, encare cada chance de ceder como um lembrete de que o maior presente que você pode dar a alguém que ama é o da aceitação incondicional.

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