ACEITE : OS SEUS AMORES NA VIDA NUNCA SERÃO DO JEITO DE QUE VOCÊ IMAGINAVA


De Bruna Grotti

Sempre gostei de olhos grandes. Achei que eles enxergassem melhor a alma. Achei que eles me despissem com mais eficácia depois de algumas taças de vinho. Achei que eles fitassem melhor os meus, que também são bem grandes. Achei que eles deixassem transparecer melhor os vícios e virtudes do dono. Sabe aqueles requisitos pra lá de babacas que a gente coloca na nossa lista de características da pessoa ideal? Então, esse era só um – e o principal – deles. Eu também sempre disse gostar de caras altos – com pelo menos uma régua Desetec a mais do que eu. E magrelos – cujas costelas eu conseguisse ver enquanto estivéssemos pelados na cama depois daquele sexozinho delícia. E barbados – com pelos suficientemente viris para arrepiar o meu pescoço. E bocudos, e donos de olheiras que demonstrassem o cansaço, e branquelinhos, e tatuados.

Hoje faço uma recapitulação na lista de homens que realmente mexeram com o meu coração. Vejo que a grande maioria deles realmente tinha barba. E bocão. E eram significativamente mais altos do que eu – porque mais baixo, só se for anão. Alguns eram divinamente magrelos; outros, deliciosamente carnudinhos. Alguns eram realmente branquelinhos; outros, maravilhosamente mulatos. Cruzei também com algumas olheiras e tatuagens por aí. Mas nenhum, absolutamente nenhum dos homens que viraram a minha cabeça tinha olhos grandes. Todos eles eram donos de olhinhos simpaticamente pequenos – a ponto de eu ter que perguntar para o meu primeiro (e único) namorado se ele, com aquele campo de visão tão reduzido, realmente enxergava o mundo como eu. E aí vem a questão que tira o sono dos racionalistas do coração: se eu nunca me apaixonei por um homem de olhos grandes, em qual referencial eu me baseava para anunciá-los como minha preferência?

Psicólogos dirão que Freud explica –ah, o pai dela deve ter olhos grandes. Realmente tem. Céticos dirão que não é possível: pelo menos meu primeiro amor deve ter tido olhos grandes – e se eu disser que não lembro se meu primeiro amor foi Cauê ou se foi Rodrigo? E que nenhum deles tinha olhos grandes? Românticos se apropriarão de uma canção sertaneja dos anos 90 e dirão queessas coisas de paixão não têm explicação. Eu, como boa apaixonada – pela vida, por sexo, por você –tô com eles e não abro. O grande erro da imensa maioria dos corações é querer racionalizar tudo. É acreditar naquela balela da matemática dos relacionamentos, que insere dois corações numa ~sábia~ fórmula e defeca algum conhecimento sobre somar e subtrair, multiplicar e dividir, completar e transbordar. É achar que a tal da química, aquela interação louca que acontece entre algumas pessoas, tem uma fórmula pré-determinada, algo como um anel benzênico que serve de aliança de compromisso a todos os dedos. É esquecer que a base de todo e qualquer relacionamento é meramente humana, e que se um não quer, dois não transam. É ignorar que não há receita de bolo para um relacionamento feliz e duradouro e que ainda não inventaram fermento que fizesse crescer o coração.

Coração cresce na mesma cadência do samba que faz a moreninha do cabelo cacheado rebolar até o chão. E que também a faz levar suavemente o copo americano de cerveja gelada até a boca, carnuda e colorida por um nada discreto batom vermelho. Samba que faz aquela morena quente sorver ferozmente a loira gelada, enquanto o suor lhe escorre pela pele. E que a faz rir jogando a cabeça pra trás, como se cada acorde daquele choroso cavaquinho lhe causasse um espasmo. Ou um orgasmo. E quando menos se espera, você, que sempre foi apaixonado por loiras de cabelos lisos, batons em tons de nude, bocas de boneca e movimentos calculadamente econômicos e delicados, está inexplicavelmente encantado pela tal da morena do samba, que não tem sequer um dos requisitos que você colocou na sua listinha de mulheres ideais, mas que é linda aos seus olhos mesmo assim. Quem diria que um dia você compraria a Suzi e deixaria a Barbie ao relento na prateleira? Pois é. Que me perdoem os lindos homens de olhos grandes e azuis, mas nas melhores noites da minha vida eu me acabei mesmo foi nos braços de donos de ternos e pequenos olhos castanhos.

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